23 de janeiro de 2012

Os 50 anos da maior lei brasileira para a educação


23 de janeiro de 2012
Educação no Brasil | O Estado de S. Paulo | Educação | BR




Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) completa meio século em plena discussão do novo plano de metas do País para a área
Mariana Mandelli
Repleta de emendas e com diversos artigos que não foram cumpridos, a principal lei do Brasil para a educação completou meio século no momento em que o País discute as metas da área para a próxima década por meio do Plano Nacional de Educação(PNE).Foi justamente ela - a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) - que instituiu a criação do plano, em sua última versão.
O ensino supletivo,a obrigatoriedade da matrícula e o atendimento gratuito em creches e pré-escolas, entre outros direitos que hoje fazem parte da vida dos brasileiros,foram garantidos pela LDB,em diversos momentos da história do Brasil.
Há três grandes versões da LDB, sem contar os "remendos" e grandes reformas pelas quais ela passou no decorrer dos anos: 1961, 1971 e 1996 - a mais atual, que está em vigor.
A primeira LDB foi sancionada em 20 de dezembro de 1961, durante o governo João Goulart, A questão, até hoje polêmica, do ensino religioso facultativo no sistema público foi um dos maiores embates. Foram necessários 13 anos de debate para que a primeira revolução educacional do Brasil acontecesse.
"A aprovação da lei de 1961 foi um grande avanço por que a legislação anterior era muito centralizadora.
Não havia nada que competisse aos Estados e municípios", explica Nina Ranieri, vice presidente do Conselho Estadual de Educação de São Paulo.
Apesar do avanço, a lei de 1961 foi considerada uma "meia vitória" - expressão usada na época pelo educador Anísio Teixeira, uma das personalidades mais importantes da história da educação no Brasil, Entre seus maiores gargalos, estão justamente o tímido efeito dos principais ganhos que ela trouxe: pouca autonomia dos municípios (ainda dependentes de Estados e da União) e pouca democratização de oportunidades educacionais na escola pública, que permaneceu elitizada.
"Além disso, houve uma fraca expansão dos cursos superiores destinados à formação de professores para a educação básica", lembra Francisco Cordão,membro do Conselho Nacional de Educação(CNE). "Faltou investimento das universidades nesse ponto, embora tenhamos assistido à uma forte expansão do ensino normal, destinado a atuar nas escolas primárias." Remendos. Em 1971, quando a segunda versão da LDB foi aprovada, o Brasil vivia um dos momentos mais críticos de sua história: a ditadura militar, em pleno governo Médici.
É dessa lei artigos como a instituição da educação moral e cívica no currículo.
Ela também valorizava a educação profissional e instituía o ensino obrigatório dos 7 aos 14 anos. Outro ganho, segundo educadores, foi a criação dos supletivos.
"Esta foi a grande inovação promovida pelos militares, que possibilitou amilhares de brasileiros a retomada de seus estudos, tanto na modalidade suplência, para suprir sua escolaridade não concluída na idade própria, quanto nas modalidades de qualificação profissional e aprendizagem", explica Cordão, que defende que essa LDB não deve ser encarada como nova lei, mas como uma reforma da anterior.
Com a redemocratização do Brasil e a Constituição de 1988, veio a necessidade de se garantir novos direitos educacionais. A discussão começou com duas propostas da lei e se arrastou por anos. Só na Câmara dos Deputados, onde foram sugeridas 1.300 emendas,o projeto tramitou por cinco anos.
"Novos tempos". Em 20 de dezembro de 1996, exatos 35 anos após a primeira LDB, ela foi sancionada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. O relator foi o senador Darcy Ribeiro - a lei ficou conhecida como "Lei Darcy Ribeiro de Educação Nacional".
Foi essa LDB que debateu a autonomia universitária, discutiu a educação a distância, enxergou a educação infantil como etapa da educação básica e de talhou como o dinheiro para a área deve ser gasto. Há 15 anos em vigor, especialistas discutem se ela ainda é válida (leia mais abaixo).
AS TRÊS VERSÕES
Descentralização do sistema educacional, dando autonomia às redes Liberdade para a escola organizar seu currículo Criação do Conselho Federal de Educação 12% do orçamento da União e 20% dos municípios para a educação Ensino primário, no mínimo, em quatro séries anuais e obrigatório a partir dos 7 anos Ano letivo de 180 dias Para o ensino primário, a formação do docente no ensino normal. Para o médio, cursos de nível superior Ensino religioso facultativo Lei nº 5.692/1971 Criação do ensino supletivo Valorização da educação profissional Matrícula obrigatória dos 7 aos 14 anos de idade Inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programa de Saúde no currículo Lei nº 9.394/1996 Inclusão da educação infantil como primeira etapa da educação básica Ensino fundamental de 8 anos obrigatório e gratuito Carga horária mínima de 200 dias letivos ou 800 horas Criação do Plano Nacional de Educação (PNE) União deve gastar no mínimo 18% e, Estados e municípios, no mínimo de 25% de com o ensino público Exigência de formação de nível superior para atuar na educação básica
CONSTRUÇÃO
Não há número oficial sobre a quantidade de emendas e alterações que a última versão da LDB, de 1996, sofreu. Mas ela já foi modificada por pelo menos 28 leis- inclusive em 2011.
Demandas como a obrigatoriedade da matrículados 4 aos 17 anos e o ensino fundamental de nove anos, por exemplo, não constam na lei original - são criações recentes. Outras modificações também estão em discussão hoje no MEC,como o aumento da carga horária e uma nova base curricular.
"O Brasil sempre teve muita lei e pouca sistematização. São muitas as leis, de diversas fontes: governo federal, conselhos nacional e estaduais, decretos, resoluções", explica Nina Ranieri, do Conselho Estadual de Educação de São Paulo. "Essa multiplicidade de fontes cria um em aranhado.
A normatização de forma geral é efêmera, com exceção, é claro, da LDB. Por isso a importância:é uma lei substantiva, com normas e diretrizes." Para alguns especialistas em educação, apesar da evolução - e também da manutenção de alguns gargalos do ensino brasileiro - , a lei de 1996 cabe dentro da realidade do País e,portanto,ainda não chegou o momento de discutir uma nova LDB.
"A lei que temos ainda dá conta.
Ela sofreu emendas positivas que a adaptam às mudanças da vida real.Não precisamos de outra LBD, mas sim da aprovação urgente do Plano Nacional de Educação (PNE)", defende a secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda.
A necessidade de aperfeiçoamentos, no entanto, é consenso entre os educadores."A lei precisa de melhorias, mas, mais do que isso, precisa ser cumprida.
Um exemplo é a questão da aplicação dos recursos obrigatórios dos municípios em educação, prevista em artigo,mas é sempre descumprida",afirma Cesar Callegari, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE).
Entre os gargalos visíveis, ele destaca que a LDB poderia ter um caráter mais fiscalizador em relação ao seu descumprimento.
"Ela poderia ao menos repetir o que há em outros dispositivos da legislação que tratam de punições aos agentes públicos que não cumprem a lei", explica.
"Normalmente, é usada a lei de improbidade administrativa." Callegari ainda destaca as exigências de formação superior e dos planos de carreira municipais dos professores como artigos não cumpridos.
Revisão. Já Maria Izabel Noronha, presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) e membro do CNE,defende que a lei seja revisada." A lei está em descompasso com a realidade e deve ser contextualizada e reescrita.
Além disso, parece um Frankenstein: está toda remendada", diz ela, autora de um estudo sobre a atual LDB.
Segundo Maria Izabel, um dos tópicos mais problemáticos é a falta de um regime de colaboração entre os entes federativos.
Para a educadora, temas como a educação rural, indígena e quilombola, entre outros,também devem ser rediscutidos.

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