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Marcha lenta
Brasil precisa acelerar a própria capacidade de inovar e investir para acompanhar a onda chinesa, que já começa a se reorientar para consumo
A incerteza quanto ao ritmo de crescimento chinês tem sido um foco de considerável tensão no cenário global. Tornou-se comum a percepção de que o país asiático ruma para uma taxa de crescimento de 7%, talvez menos, nos próximos anos. Há temor de uma desaceleração abrupta.
Um fator agravante para países exportadores de matérias-primas, como o Brasil, decorre da reorientação do crescimento chinês, cujo apetite por commodities como minério de ferro tende a ceder espaço ao consumo de bens e serviços, conforme a economia chinesa muda de patamar.
Não é difícil encontrar evidências isoladas para a tese. A corrente de comércio (soma das exportações e importações) entre Brasil e China teve crescimento de apenas 10,5% no primeiro trimestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2011. Nos dois anos anteriores, a variação fora de 45% e 32%, respectivamente, na mesma base de comparação.
O fraco resultado da Vale no primeiro trimestre, com preços de minério de ferro 12% menores que em igual período de 2011, seria outra indicação da menor demanda no país asiático.
A reorientação da economia chinesa parece certa, tendo em vista certo esgotamento na ampliação da infraestrutura e a dificuldade de manter uma taxa de investimento de 45% do PIB, muito acima do padrão mundial. É inevitável que haja um declínio.
No entanto, salvo um colapso de crescimento que não se avizinha, essa nova dinâmica deve se consolidar lentamente, ao longo de vários anos.
Para o Brasil, o impacto pode se mostrar heterogêneo. A menor demanda chinesa provavelmente prejudicará exportações de minerais e matérias-primas metálicas, ao passo que vendas de produtos agropecuários devem continuar crescendo. No caso da soja, maior receita depois do minério de ferro, os embarques chegaram a US$ 2 bilhões no primeiro trimestre deste ano, alta de 126%.
No cômputo geral, pode ocorrer certa estabilidade nos termos de troca (razão entre os preços de exportações e os de importações) e dos volumes exportados, o que não seria um resultado ruim. O temido colapso das vendas brasileiras pode demorar a chegar.
Esse é o lado bom. O mau é a persistente concentração da pauta brasileira de exportações no segmento de commodities. O Brasil não consegue ter bom desempenho exportador, naquele que em breve será o maior mercado do mundo, em nenhum segmento de manufaturas nem de serviços.
Mais do que qualquer reviravolta chinesa, são os fatores internos -em especial a nossa capacidade de inovar e investir- que determinarão as chances do Brasil de explorar tal oportunidade.
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