A ascensão do Brasil muda a relação com os EUA, e crescem os interesses em prol de maior aproximação
Leon Panetta, chefe do Pentágono, esteve aqui na semana passada para encerrar três décadas de distanciamento entre o Brasil e os EUA na área de defesa. A tarefa será longa porque os dois países têm visões fundamentalmente distintas da segurança internacional.
As ameaças que mais preocupam o governo americano -terrorismo, radicalismo islâmico e proliferação nuclear- são secundárias para o governo brasileiro. Enquanto isso, em Washington, quase ninguém entende por que Brasília prioriza ameaças como a fragilidade das fronteiras e as riquezas naturais da Amazônia e da plataforma continental no Atlântico.
Também há boa dose de choque de interesses. Os dois países têm leituras opostas sobre o que fazer sobre Cuba, Venezuela, Colômbia e Honduras. Não concordam a respeito de Irã, Palestina, Líbia ou Síria.
Na concepção brasileira, os americanos usam e abusam das regras do jogo para impor suas preferências sobre os mais fracos. Na concepção americana, o comportamento brasileiro tem um quê de ingenuidade típica de um país que pretende jogar na liga dos pesos-pesados sem ter os meios para fazê-lo.
Isso não fez dos dois países rivais ou adversários, mas criou entre ambos um enorme distanciamento.
O processo brasileiro de ascensão ora em curso está transformando essa realidade. No novo contexto, crescem poderosos interesses em prol da aproximação. O destaque vai para duas forças complementares.
A primeira é o dinheiro. Nos últimos dez anos, o orçamento brasileiro de defesa passou de R$ 45 bilhões para R$ 65 bilhões. Representando apenas 1,5% do PIB, ainda tem muito espaço para crescer. Assim, a indústria militar americana vê no Brasil um grande comprador potencial, ao passo que o emergente complexo industrial de defesa brasileiro enxerga uma oportunidade para assinar contratos nos EUA.
Os grupos interessados em ambos os países não se limitam aos gigantes Boeing e Embraer, mas incluem centenas de empresas nas áreas de energia renovável, nanotecnologia, ciberespaço, atividades espaciais e usos civis da tecnologia nuclear.
A segunda força de aproximação é a nova projeção global da política externa brasileira. A crescente flexibilidade para participar de operações de paz e os novos recursos disponíveis para oferecer cooperação técnica internacional fazem do Brasil um ator cada vez mais útil na promoção da paz e da estabilidade no mundo. No Haiti, essa atitude levou à mais intensa cooperação militar com os Estados Unidos desde a Segunda Guerra Mundial.
O próximo teatro de cooperação será a África, onde os países têm crescentes interesses de segurança.
O Brasil emergente não buscará uma aliança militar com os Estados Unidos nem aceitará limitar sua própria autonomia. Contudo, poderá instrumentalizar sua relação com a maior potência do mundo para facilitar suas ambições globais.
Se essa aproximação der certo, será, em grande medida, devido ao trabalho silencioso dos militares dos dois países. Existe entre eles uma reserva gigantesca de boa vontade. Esse contato representa uma incipiente rede transnacional de profissionais que já está muito à frente do vagaroso ritmo dos acordos oficiais entre os dois governos.
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