Autor(es): ISAAC ROITMAN |
Correio Braziliense - 24/12/2013 |
Professor emérito e coordenador do Núcleo de Estudos do Futuro da Universidade de Brasília (UnB)
Em 2011, escrevi uma carta para você, na qual pedi como presente de Natal que nossos governantes e governados pudessem pensar e agir com sabedoria. Pedi também que todos tivessem respeito à natureza e que a justiça social fosse conquistada, para que pudéssemos ter um Brasil livre da miséria, com vida digna para todos. Quase dois anos se passaram. Aqui e ali percebemos algumas melhoras. No entanto, meus pedidos não foram atendidos em sua plenitude. Assim, meu bom velhinho, volto a lhe escrever. O país continua desigual, a educação deficiente, o atendimento à saúde precário, a violência com índices alarmantes e o consumo de drogas aumentando, o que nos obriga a viver em um mundo desumano e cada vez mais selvagem. Sei que meus pedidos são complexos em uma era de grandes incertezas. Sei que em dois anos não podemos conquistar todos os sonhos e as utopias. No entanto, podemos avançar e avançar todos os dias. Permita-me, então, elencar algumas prioridades. A primeira seria a conquista da qualidade da educação básica para todos os brasileiros. A igualdade de oportunidades, independentemente da classe social, seria um passo gigantesco para consolidar a nossa democracia. A segunda seria a implantação da reforma agrária, tão prometida e nunca cumprida. Ela é imperativa para garantir o direito ao acesso à terra para quem nela vive e trabalha e alteraria a tendência da explosão urbanística dos grandes centros, com suas cruéis consequências. A terceira seria a conquista de um atendimento de qualidade na saúde, acompanhado por um investimento focado na promoção da saúde, que envolveria uma alimentação correta e infraestutura de saneamento básico universalizada. A quarta, que todos os brasileiros tivessem uma casa decente para morar, com espaços culturais e esportivos disponíveis, e que pudessem ser utilizados por todos. A quinta é que a impunidade entre nós seja parte do passado. Ela, quando tolerada, enfraquece o Judiciário e deteriora a democracia. Por favor, comprenda a minha insistência e dê atenção à minha nova carta. Muitos de meus desejos coincidem com o clamor das ruas de muitas cidades brasileiras. Esse clamor revela uma profunda insatisfação popular, com o desejo, entre outras coisas, de transporte público decente, educação e saúde de qualidade para todos, sem exclusões nem privilégios. Os meus desejos certamente expressam um desejo coletivo. A criança que nunca deixei de ser me faz ainda confiar em você. No entanto, para facilitar suas tarefas, decidi mandar cópias desta carta para a presidente do Brasil, para todos os ministros, para todos os senadores e deputados do Congresso, para todos os governadores, para todos os deputados estaduais, prefeitos, vereadores e juízes. Quem sabe muitos deles levem a sério os desafios explicitados. Quero também dividir com você alguns pensamentos sobre o Natal, em que você é figura central. É uma data mágica, na qual a conspiração pela bondade é vitoriosa. Somos induzidos pelo clima natalino a pensar na solidariedade, na compaixão e nos preocupamos com a fome e a miséria humana. No Natal, renasce em nós a esperança na humanidade e na permanente generosidade. Nosso sonho pode se resumir em termos um país feliz e um planeta com sustentabilidade e sem guerras. Seria tão bom se todos os dias do ano fossem iguais ao Natal. Teríamos todos os dias, nos iluminando, o afeto e o amor. Teríamos as famílias reunidas e amigos se reencontrando. As mesas seriam fartas e em todo lugar aonde chegássemos, seríamos convidados a compartillhar algo. Todos os dias a tolerância permearia as relações humanas, permitindo um convívio virtuoso diante da diversidade. Seríamos felizes sem motivo, o que, segundo Carlos Drummond de Andrade, é a mais autêntica forma de felicidade. Meu bom velhinho, desculpe novamente pelos desabafos, desejos e fantasias. Mas, como diz a sabedoria popular, o maravilhoso da fantasia é nossa capacidade de torná-la realidade. Vou ficar observando o céu nas próximas noites, com a esperança de ver uma estrela cadente e ouvir um alegre hô-hô-hô, que será o sinal da chegada de melhores dias para o nosso Brasil. Esse será o melhor presente de Natal para todos os brasileiros.
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24 de dezembro de 2013
Carta ao Papai Noel 2, Isaac Roitman
Postado por
jorge werthein
às
19:12
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