Estratégia internacional do Brasil foi baseada na tese, equivocada, de que poder dos EUA declinaria a longo prazo
Acaba de sair uma leva de estudos a respeito do impacto da crise financeira de 2008-2009 sobre o equilíbrio de poder mundial.
O material sinaliza uma mudança nos termos da conversa global sobre o tema, pois revelam que nem os Estados Unidos declinaram nem a China ascendeu como muitos esperavam. Pelo contrário, a hegemonia econômica norte-americana apresentou uma fabulosa capacidade de adaptação.
Os autores são acadêmicos e intelectuais de esquerda cujos trabalhos podem ser lidos nos números mais recentes de "International Studies Quarterly" e "Review of International Political Economy".
De 2008 para cá, os investidores norte-americanos galgaram posições na carteira de ações de multinacionais de países como China, Índia e Brasil.
Em eletrônicos, farmacêuticos, mídia, petróleo e serviços bancários, a preponderância norte-americana ficou inquestionável.
Um fator central é a resiliência do dólar: não tem euro, renminbi ou cesta de moedas capaz de desafiá-lo. Não à toa, após a crise, o governo chinês incrementou sua compra de títulos do Tesouro norte-americano. E quando a agência Standard and Poor's rebaixou a nota da dívida dos Estados Unidos, em 2011, o mercado não reagiu fugindo, mas investindo ainda mais.
"Ah", dizem os críticos, "mas os Estados Unidos têm um deficit gigantesco". Sim, e sua capacidade de mantê-lo revela a dimensão de sua força.
"Mas a desigualdade americana está em alta". E você esperava o que de um capitalismo pujante?
"Mas o desemprego nas capitais americanas aumenta". Claro, os investidores americanos migraram a produção industrial pesada e mais poluente para a Ásia, em busca de melhores margens de lucro.
Sem dúvida, a gestão da ordem global está muito longe de ser controlada pelos Estados Unidos. E as vozes fora do Atlântico Norte têm uma influência antes inimaginável.
Mas os estudos mostram que a expectativa de uma nova distribuição de poder no cenário internacional foi exagerada.
A consequência disso para a condução da política externa brasileira é direta: boa parte da estratégia internacional brasileira durante os últimos anos foi baseada na tese de que, a médio e longo prazo, o poder americano declinará.
Se o cenário é de hegemonia inconteste dos Estados Unidos, qual diplomacia é mais benéfica para os 200 milhões de brasileiros?
Até agora, a única figura pública a alertar para a retomada econômica dos Estados Unidos e seus impactos geopolíticos tem sido FHC. Sua conclusão é a esperada: o país precisa de um novo ciclo de adesão à globalização.
Falta saber o que pensa a esquerda. Aderir ao novo ciclo de globalização pode resolver uma série de problemas, mas criará outra.
Se o poder americano segue em alta --e se a ênfase em diplomacia Sul-Sul apresenta, por isso mesmo, limites estreitos--, o que fazer?
Folha de S.Paulo,11/12/2013
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