17 de dezembro de 2013 | 2h 06
O Estado de S.Paulo
Que a situação da segurança pública é ruim em todo o País é coisa há muito sabida, por experiência, tanto pela população, que sente isso na carne, em seu dia a dia, como pelas autoridades. Mas, quando expressa em números por meio de levantamento rigoroso, constata-se que na realidade ela é muito pior. É o que mostram os resultados da primeira Pesquisa Nacional de Vitimização, feita pela Secretaria Nacional de Segurança Pública em conjunto com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG e o Datafolha.
A parte da população afetada diretamente pela violência é muito grande, maior do que se poderia imaginar. Nada menos do que um em cada cinco brasileiros que vivem nas cidades com mais de 15 mil habitantes foi vítima de uma ação criminosa no período de 12 meses abrangido pela pesquisa - agressão, sequestro, fraude, ofensas sexuais, discriminação, furto e roubo. Ou então de acidente de trânsito. A porcentagem da população vítima desses vários tipos de ocorrência varia muito de Estado para Estado - de 46% no Amapá, o pior colocado, a 17% em Santa Catarina. Mas mesmo o índice deste último, o menos violento, ainda é alto. A situação dos mais ricos - São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente, com 20,1% e 20% - é também ruim.
Não admira que 64,9% dos brasileiros manifestem o medo de ser assassinados e que a sensação de insegurança seja maior em cidades tão diferentes como Belém, Maceió, São Paulo e São Luís. E um sinal de que a população encara com pessimismo a evolução da situação é que para 60,3% das pessoas ouvidas a criminalidade piorou. Pessimismo que outros dados reforçam. Apenas 19,9% das vítimas procuram a polícia, ou seja, a grande maioria - 80,1% - prefere o silêncio. Isso quer dizer que, na verdade, os números sobre a criminalidade no País são ainda piores e, consequentemente, é maior a gravidade da situação.
O silêncio das vítimas - que também não é novidade - está diretamente ligado à falta de confiança na eficiência do aparelho policial. A relação da população com a polícia é ambígua. Por um lado, é elevado o índice de confiança dos entrevistados tanto na Polícia Militar (77,6%) como na Polícia Civil (79,1%). E 54,6% dos que procuram a polícia se declaram satisfeitos, mas por razões que pouco têm a ver com seu desempenho profissional - 23,2% atribuem a avaliação positiva ao atendimento cordial recebido e 24,2% à boa vontade para resolver o problema apresentado. Por outro lado, só 3,7% afirmaram que o criminoso foi preso e 2,5% que foram informados do andamento da investigação.
É sem dúvida positivo que o atendimento nas delegacias tenha melhorado. Tratar bem os cidadãos é obrigação elementar dos servidores públicos, embora até pouco tempo atrás essa regra não recebesse a devida atenção da polícia. Mas isso, se não for acompanhado pelo mais importante - que é a eficiência na solução dos crimes -, não ajuda muito. Na realidade, como se vê, a confiança da população na polícia é bem menor do que parece à primeira vista. E essa confiança, como comprova o exemplo dos países onde ela existe em alto grau, é importante para o trabalho policial.
A pesquisa não só mostra a gravidade da situação da segurança pública, que há muito está no centro das preocupações dos brasileiros, como indica as principais questões a serem atacadas. E deixa claro também que as dimensões e características do problema exigem estreita colaboração entre União e Estados, tanto no terreno policial como no do sistema penitenciário. E, no caso específico dos Estados, um esforço maior que o feito até agora para acabar com as disputas entre as Polícias Civil e Militar, cuja desarticulação só favorece os bandidos.
Deixar de lado disputas político-partidárias é condição essencial para que essa ação conjunta se torne realidade. Isso não é nada fácil, mas os números indicam que a situação chegou a um ponto em que o interesse público tem de ser colocado acima de mesquinhas disputas de prestígio e poder. É o que certamente a população espera dos governantes.
Estado de S.Paulo, 17/12/2013
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