A legitimidade jurídica e simbólica concedida pelo STF às políticas de cotas nas universidades abriu um importante precedente para que caminhemos na direção do reconhecimento da diversidade, pluralidade e heterogeneidade da constituição de nossa nação
As primeiras políticas públicas de fomento às ações de discriminação positiva se deram na Índia Colonial, implementadas pela administração britânica, com a finalidade de suprimir as desigualdades ocasionadas pelo sistema de casta em vigor, à época. Estas primeiras investidas de estabelecimento de cotas, diante do valor hierárquico e desigual do regime de castas no período, resultaram em fortes reações das denominadas castas altas contra as castas baixas.
Décadas depois, o sistema de cotas, com a constituição de mecanismos de inclusão de minorias na década de 60 do século XX no EUA, foi objeto de políticas públicas dirigidas a suplantar as desigualdades provocadas pela escravidão e, posteriormente, o sistema segregacionista que vigorou durante décadas nos EUA. Tal experiência foi replicada, com algumas alterações, em diversos outros Estados nacionais contemporâneos.
No entanto, países como a França e o Brasil, por exemplo, foram durante anos refratários à constituição de mecanismos que visassem a superar as desigualdades de cunho étnico/racial. Na França, em particular, a ideologia republicana foi, e continua sendo, uma barreira ao reconhecimento dos direitos das minorias, diante da invisibilidade política de que gozam no espaço público. A recusa a incluir categorias raciais no Censo e a proibição do uso do véu e da burca nas escolas e, atualmente, nas ruas, expõem as dificuldades da França em reconhecer sua pluralidade.
No Brasil, a nossa extemporânea e deslocada auto-imagem de uma democracia racial forjou uma visão míope quanto aos efeitos de um regime escravocrata que vigorou até meados da fundação de nossa República. Ao contrário do que ocorreu em países como a Índia, EUA e, mesmo, a França, as populações provenientes do regime escravista foram objeto de políticas de exclusão de acesso aos bens primordiais do mercado, como a educação, a terra e o trabalho. A ideologia da democracia racial, tão cara à formação de nosso Estado-nação, foi uma dura barreira para o reconhecimento de desigualdades geradas por um sistema cujos grupos étnicos que compuseram nossa identidade nacional foram alijados do sistema político, econômico e simbólico.
Todavia, a partir dos anos 90 do século passado, assistimos no Brasil a diversas ações afirmativas no âmbito das políticas públicas, como as reservas de vagas nas universidades, as políticas de titulação de terras das comunidades indígenas e quilombolas, as políticas educacionais diferenciadas dirigidas às populações tradicionais, entre outras, conformando um novo cenário político.
Um país justo e democrático deve conceder o direito de manifestação das múltiplas formas de expressões identitárias, reconhecendo que barreiras étnicas e raciais compõem as variáveis que culminam na exclusão e na desigualdade, bem como fazendo com que direitos diferenciados possam propiciar o aperfeiçoamento do sistema democrático, suplantando o malefício da desigualdade histórica e estrutural.
FABIO REIS MOTA é professor da UFF-InEAC/NUFEP/PPGA.
Décadas depois, o sistema de cotas, com a constituição de mecanismos de inclusão de minorias na década de 60 do século XX no EUA, foi objeto de políticas públicas dirigidas a suplantar as desigualdades provocadas pela escravidão e, posteriormente, o sistema segregacionista que vigorou durante décadas nos EUA. Tal experiência foi replicada, com algumas alterações, em diversos outros Estados nacionais contemporâneos.
No entanto, países como a França e o Brasil, por exemplo, foram durante anos refratários à constituição de mecanismos que visassem a superar as desigualdades de cunho étnico/racial. Na França, em particular, a ideologia republicana foi, e continua sendo, uma barreira ao reconhecimento dos direitos das minorias, diante da invisibilidade política de que gozam no espaço público. A recusa a incluir categorias raciais no Censo e a proibição do uso do véu e da burca nas escolas e, atualmente, nas ruas, expõem as dificuldades da França em reconhecer sua pluralidade.
No Brasil, a nossa extemporânea e deslocada auto-imagem de uma democracia racial forjou uma visão míope quanto aos efeitos de um regime escravocrata que vigorou até meados da fundação de nossa República. Ao contrário do que ocorreu em países como a Índia, EUA e, mesmo, a França, as populações provenientes do regime escravista foram objeto de políticas de exclusão de acesso aos bens primordiais do mercado, como a educação, a terra e o trabalho. A ideologia da democracia racial, tão cara à formação de nosso Estado-nação, foi uma dura barreira para o reconhecimento de desigualdades geradas por um sistema cujos grupos étnicos que compuseram nossa identidade nacional foram alijados do sistema político, econômico e simbólico.
Todavia, a partir dos anos 90 do século passado, assistimos no Brasil a diversas ações afirmativas no âmbito das políticas públicas, como as reservas de vagas nas universidades, as políticas de titulação de terras das comunidades indígenas e quilombolas, as políticas educacionais diferenciadas dirigidas às populações tradicionais, entre outras, conformando um novo cenário político.
Um país justo e democrático deve conceder o direito de manifestação das múltiplas formas de expressões identitárias, reconhecendo que barreiras étnicas e raciais compõem as variáveis que culminam na exclusão e na desigualdade, bem como fazendo com que direitos diferenciados possam propiciar o aperfeiçoamento do sistema democrático, suplantando o malefício da desigualdade histórica e estrutural.
FABIO REIS MOTA é professor da UFF-InEAC/NUFEP/PPGA.
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