23 de maio de 2012

Tablet transformará educação?

Jornal do Comercio, PE, 23/05/2012

É o sonho dourado de educadores e alunos do século 21: cada adolescente com seu próprio tablet, carregado com material didático digital, e ainda podendo compartilhar informações, usar dispositivos eletrônicos para ampliar a experiência de ensino e ter acesso instantâneo à informação. Tudo a favor da construção do conhecimento numa sociedade que tem nisso sua maior moeda. É um sonho que pode estar começando a se tornar realidade com a introdução dos tablets híbridos do programa Aluno Conectado, do governo do Estado. A partir deste mês, 152 mil alunos de escolas públicas do 2º e 3º ano do ensino médio receberão o equipamento da Digibras, divisão da CCE, comprados por R$ 629 cada. Mas será que só o equipamento basta para revolucionar a educação no Estado, como deseja o governo?
Tudo vai depender do conjunto de softwares que virá embarcado no equipamento , analisa o professor de química da rede estadual e graduando em ciência da computação Afonso Feitosa. Para ele, é preciso, de cara, deixar mais claro quais serão os dispositivos embutidos nas máquinas para que os professores comecem a planejar a utilização em sala de aula. Até agora esses softwares são um mistério. E isso faz toda a diferença, porque um computador, por si só, não muda nada. O que tem que mudar é o uso do equipamento na educação , afirma.
O professor mostra preocupação também com relação à conectividade nas escolas. Também não adianta nada ter uma ferramenta dessas e não ter internet na escola. E tem que ser de excelente qualidade. Não há condições de num colégio de 700 alunos, por exemplo, haver uma rede compartilhada de 2 Mbps. Tem que ter pelo menos 30 Mbps , destaca. Outro ponto levantado pelo professor é a capacitação, que deve ser aprofundada. Se for só para dar aula de Powerpoint não adianta. Tem que haver imersão profunda nos softwares educacionais que virão na plataforma , diz.
Pelo menos no discurso, a Secretaria de Educação de Pernambuco está em sintonia com a preocupação dos professores. Segundo o secretário Anderson Gomes, o tablet virá com um conjunto de 12 softwares educacionais, mais acesso à rede de acompanhamento da Intel, criadora da plataforma educacional usada no equipamento da Digibras.
Entre eles, estão kits de ciências que podem ser usados em conjunto com sensores plugados à máquina, como microscópios, medidores de temperatura e acelerômetros. Também está incluído um software de reconhecimento de escrita que reconhece até mesmo operações matemáticas. Segundo Gomes, a expectativa é que todo material didático usado nas escolas seja digital ainda este ano.
No quesito capacitação, o plano da secretaria é que todos os professores diretamente envolvidos no projeto recebam treinamento da Intel. Os cursos começaram há uma semana. Primeiro vamos mostrar como usar a tecnologia dentro da sala de aula. Depois discutiremos como criar projetos de aula usando a mentalidade e as ferramentas do século 21 , diz o gerente de definição de plataforma da Intel, Russell Beauregard, que semana passada esteve no Recife para apresentar a solução aos gestores da educação de Pernambuco. Também queremos fazer uma capacitação específica nas ferramentas educacionais da Intel , diz. Todo o treinamento, segundo o secretário Gomes, será financiado pela divisão de responsabilidade social da Intel.
Conectividade é o elo mais frágil da equação. Mas, segundo Gomes, 950 escolas do Estado estarão conectadas à internet até o fim do ano. Hoje temos 400 escolas com infraestrutura sem fio. Até dezembro conectaremos mais 550 , diz.
O cronograma de implantação segue a mesma lógica da distribuição dos tablets. De início, a capital e as maiores cidades do litoral receberão os equipamentos e a infraestrutura de rede. Ao longo do ano, o processo será interiorizado. Vamos iniciar uma revolução na educação e na inclusão digital. Estimo que esta será a primeira experiência com computadores para pelo menos metade dos jovens do Estado , aposta Gomes.
Para o pedagogo Luciano Meira, esta não é uma aposta apenas do governo de Pernambuco. É uma grande aposta de todos os governos do planeta. Na Coreia, por exemplo, pretende-se eliminar os livros didáticos em papel até 2015. E acho que Pernambuco está muito avançado nesse processo , diz. No entanto, Meira concorda que adicionar o silício na sala de aula não significa modificar a qualidade do ensino. É preciso rever os processos de aprendizado a partir da tecnologia.
Tem que se reconhecer que inovação didática não é inovação tecnológica. Os professores têm que usar competências que eles já possuem, mas de forma nova , comenta o pedagogo. Ele diz, por exemplo, que buscar uma informação no Google é semelhante a procurar um livro na biblioteca. O ponto é que as crianças e adolescentes são bons em usar o Google. Já os professores são bons em apontar o caminho do conhecimento. É preciso casar essas duas qualidades , diz.
Uma crítica de Meira, contudo, é que o ambiente escolar tem que estimular a cooperação e o compartilhamento de informações. As escolas não têm sido um bom ambiente de colaboração. Tem que se levar em conta que nesse novo ambiente, o professor não será a única voz disseminando o conhecimento. Na verdade, é possível que ele nem seja a maior voz. Os professores têm que aprender a dialogar , afirma.
ENERGIA
Além de ter que resolver questões como capacitação e a integração entre professores, alunos e equipamentos, há questões técnicas que complicam ainda mais a implantação dos tablets híbridos na educação do Estado. Um dos principais é o fator energético. É que a bateria do computador tem duração de cinco horas, menos até que a dos netbooks convencionais. No caso de escolas regulares, a autonomia dos equipamentos pode até ser suficiente na maior parte do tempo.
Mas e no caso de escolas com horário integral, como o Ginásio Pernambucano? Ou o que fazer se o aluno esquecer de dar carga completa no equipamento na noite anterior à aula? A solução óbvia (ou seja, a inclusão de mais tomadas nas salas de aula) parece simples, mas requer uma matemática complexa. O impacto dos tablets na conta de energia das escolas estaduais não foi nem sequer mencionado no plano dos tablets. (J.W.)

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