16 de maio de 2012

Quem quer consegue: Educação





A história de um grupo de municípios brasileiros, revelado em um novo ranking, mostra que é preciso aliar medidas simples à disciplina para distanciar-se da mediocridade

Fonte: Revista Veja
A última grande radiografia do Ensino público brasileiro reforça o abismo que nos separa dos melhores do mundo na sala de aula. Enquanto nos países mais desenvolvidos 57% dos estudantes do Ensino fundamental detêm o conhecimento esperado para sua série, ou vão muito além disso, no Brasil é ainda maior do que essa fatia a dos que não sabem o mais básico – 77%. Diante de tamanha desvantagem, é bem-vindo o exemplo de um pequeno e pouco conhecido conjunto de municípios que emerge do lamaçal de notas vermelhas em meio à mesma coleção de dados, extraídos da Prova Brasil, do Ministério da Educação (MEC). Ainda que com uma longa estrada a percorrer até alcançar os mais ricos, são esses que, no Brasil, concentram a maior porção de Alunos situados em nível ao menos “adequado” para o ano que estão cursando. O novo levantamento, conduzido pela ONG Todos pela Educação, surpreende à primeira vista. Afinal, os dez municípios no topo do ranking têm erguido as bases para a boa Educação em condições muito semelhantes às dos demais, ou até piores que as deles. Seu sucesso ajuda a decifrar os caminhos que conduzem à excelência.
Um fato chama atenção no rol dos dez melhores municípios da lista: sete são mineiros, incluindo os cinco que lideram o ranking. O resultado enfatiza o que outras avaliações do MEC vêm sinalizando nos últimos anos. Analisa o economista Cláudio de Moura Castro, especialista em Educação e articulista de VEJA: “Essas cidades não estão fazendo nada de mirabolante, mas sim levando a cabo um conjunto de iniciativas coerentes que têm tido continuidade, algo raro no país”. Elas foram postas de pé na década de 90 e agora começam a se refletir nos números. Minas Gerais foi o primeiro estado a formular uma prova única para mapear as deficiências dos Alunos e lançar luz sobre os bons casos, saindo na dianteira na criação de metas para a sala de aula. As Escolas passaram então a ser cobradas e até premiadas por seu cumprimento, tal como no mundo corporativo, com um bônus salarial para os profissionais que elevam o nível do Ensino. O sistema é hoje adotado em cerca de 20% das 180000 Escolas públicas brasileiras.
O campeão da lista da Todos pela Educação é São Tiago, município de 10000 habitantes a duas horas de carro de Belo Horizonte. Ali, vive-se basicamente do plantio de café e da fabricação de biscoitos. Na Escola estadual Afonso Pena Júnior, que atende 1100 Alunos, os Professores chegam a dar aulas extras (sem ganhar nada a mais por isso) em prol da média nos exames oficiais. Por estes, sim, podem ser recompensados. Um grupo de estudantes do colégio venceu um campeonato nacional de robótica e, não cabendo em si, está prestes a embarcar para o México para defender o Brasil no circuito mundial. Na aula de química, eles desenvolveram um projeto de extração de álcool da laranja por meio de fermentação, experiência que interessou à Universidade de São Paulo (USP). Tanto que uma turma de São Tiago, muitos dos Alunos vindos de famílias pobres que jamais haviam deixado o estado, foi convidada para falar sobre o trabalho em São Paulo. “O objetivo aqui é ir muito além dos muros da Escola”, diz a diretora Maria Auxiliadora Silva, 47 anos, há dez no cargo.
O que afinal une os colégios dos municípios em destaque é a junção de medidas já testadas em outros países com um lado pragmático que se sobrepõe ao corporativismo ainda em voga no ambiente Escolar. Dados da Prova Brasil mostram que, até hoje, são minoria os diretores de Escola que chegam ao cargo por um sistema que alie quesitos técnicos a uma eleição, e não por critérios políticos: eles representam apenas 13% do total – em Minas, são 60%. Outro ponto que aproxima os municípios campeões é a existência de um currículo único para a sala de aula, item que começa a se disseminar no Brasil, embora sofra certa resistência daqueles mestres que não querem ver-se tolhidos em sua “liberdade de ensinar”, um discurso meramente ideológico. “Faz uma enorme diferença quando o Professor tem um roteiro mínimo sobre o que e como ensinar”, diz o doutor em estatística José Francisco Soares, especialista em Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. O ranking também espelha um claro esforço por parte das Escolas que figuram no topo para manter seus Docentes atualizados. “Na década passada, o nível dos Professores aqui era muito baixo, mas já melhorou e precisa seguir avançando”, reconhece Maria Aparecida Macedo, secretária de Educação de Itaú de Minas, a 360 quilômetros da capital, uma das campeãs.
A ONG Todos pela Educação estabeleceu uma meta ambiciosa para os 5 500 municípios brasileiros. Até 2022, todos devem alcançar o atual patamar da OCDE. “O Brasil já tem um bom plano, mas ainda falta provê-lo de incentivos certos para que saia do papel”, diz a diretora executiva da ONG, Priscila Cruz. Os últimos dados sobre a Escolaridade das famílias da atual geração de estudantes brasileiros mostram que 58% não chegaram sequer ao Ensino médio – e sinalizam para a necessidade de acelerar o passo para ombrear com os países mais desenvolvidos. O raro entusiasmo pelos estudos despertado em Alunos como Higor Bartolomeu, 15 anos, morador da mineira Guaxupé, outra das campeãs, revela que, com empenho máximo, pode dar certo. Diz o menino, que oscila entre o trabalho na lavoura e o esmero para gabaritar as provas de matemática, que adora: “Não aceito menos do que a nota 10”.
Excelência à mineira
Um novo ranking feito pela ONG Todos pela Educação destaca os municípios brasileiros que, embora com resultados ainda distantes dos de países mais avançados na sala de aula, concentram o maior número de alunos com conhecimento adequado ou até superior ao esperado para a série que cursam

(Porcentual dos estudantes que atingem ou extrapolam as metas)
1º São Tiago (MG) 49%
2º Guaxupé (MG) 48%
- Itaú de Minas (MG) 48%
4º Monte Santo de Minas (MG) 46%
5º Capelinha (MG) 43%
- Amambaí (MS) 43%
7º Elói Mendes (MG) 41%
- João Monlevade (MG) 41%
- Novo Horizonte (SP) 41%
- Vargem Alta (ES) 39%

Média dos municípios brasileiros: 23%
Média dos países da OCDE 57%

Fontes: dados da Prova Brasil, do MEC, relativos ao resultado do 9º ano do ensino fundamental em língua portuguesa, e Pisa 2009

Uma receita campeã
O que explica o alto nível de ensino nos municípios que encabeçam a lista do Todos pela educação

- Diretores selecionados por critérios técnicos
- Incentivo financeiro aos professores com melhores resultados
- Cursos constantes para a atualização dos mestres
- Currículo único e bem organizado
- Valorização da leitura
- Participação dos alunos em competições nacionais em todas as disciplinas
- Iniciativas para atrair a família à escola

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