8 de maio de 2012

Negros sofrem mais mortes violentas

Estudo de instituto de São Paulo coloca o DF na quinta posição nacional no total de assassinatos de afrodescendentes em 2010. A taxa é 60% maior do que a de brancos e pardos


» SAULO ARAÚJO,  Correio Brasilense, 8 de maio, 2012

Por cinco gramas de droga, um jovem de 17 anos, foi executado com um tiro na cabeça. O morador da Ceilândia perdeu a vida porque não pagou R$ 10 a um traficante, dinheiro referente a uma pequena pedra de crack. O crime ocorreu no início de abril. O garoto negro se encaixa no perfil das vítimas de assassinatos do Distrito Federal. O estudo Os Novos Padrões da Violência Homicida do Brasil, do Instituto Sangari, de São Paulo, mostra que, na capital do país, morrem cinco vezes mais negros do que brancos em crimes violentos.
No ranking nacional de pessoas executadas em 2010, o DF figura na 10ª posição, com uma média de 34,2 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes, 30% acima da média nacional, que é de 26,2 homicídios. Quando a análise se restringe à população afrodescendente, Brasília passa a ocupar a 5ª colocação, com taxa de 55,5 assassinatos para cada 100 mil moradores (leia arte). Ou seja, a mortalidade entre negros é 60% maior do que entre brancos e pardos. Para se ter uma ideia da diferença, a mortandade entre brancos no DF é de apenas 10 para cada grupo de 100 mil.
A maior preocupação é que, ao contrário de outras unidades da Federação, o DF apresentou um crescimento no número de vítimas negras nos últimos anos. Em 2006, por exemplo, essa taxa de homicídio era de 46,9 para cada 100 mil habitantes. Quatro anos depois, subiu para 55,5, representando um incremento de 17%. No Piauí, a média não passa de 15 negros mortos.
Especialistas ouvidos pelo Correio atribuem a posição do DF a uma série de fatores. Um deles é a expansão das drogas nas periferias, endereço da maioria dos jovens pobres e negros. A discrepância na aplicação das políticas públicas no DF e no Entorno também ajuda a entender as estatísticas. O pesquisador Júlio Jacobe, autor do trabalho, admitiu surpresa com a realidade brasiliense.
Para ele, a explicação para tal situação é um sinal de que o governo local falha na tentativa de diminuir as diferenças. "Percebemos que, no DF, há uma exacerbada violência contra negros. Isso acontece por duas razões: a primeira é o trato despendido às áreas nobres e às áreas carentes. No Plano Piloto, composto por uma maioria branca e de elevado padrão financeiro, sempre há mais policiamento em relação ao número de habitantes do que nas cidades mais pobres, onde concentram-se a maioria dos negros. Esse tratamento diferenciado certamente faz esse índice de mortes entre negros ser mais elevado", afirmou Júlio Jacobe.
A coordenadora do Movimento Unificado do DF, Jacira da Silva, concorda com o pesquisador. Para ela, a violência exacerbada contra afrodescendentes permanecerá em patamares elevados enquanto instituições importantes como, por exemplo, a polícia e a escola não mudarem os paradigmas. "A verdade é que, no Brasil e especialmente no DF, a violência tem endereço, sexo e cor. O primeiro suspeito num grupo é sempre o rapaz negro, pobre e que mora na periferia. Isso agride a dignidade da pessoa e faz com que muitos cresçam revoltados", destacou.
Jacira ainda citou o caso do médico Heverton Campos Menezes, 62 anos, que há duas semanas xingou uma atendente de cinema negra num shopping da Asa Norte. Ele foi indiciado por injúria racial. "Hoje, ainda vivemos numa sociedade escravocrata com uma outra roupagem. O que o médico fez é o que ocorre todos os dias em outros lugares, mas de forma diferente. O preconceito também é a forma como o jovem negro é abordado por um agente do Estado. Infelizmente, o racismo ainda se mantém vivo e com força", acrescentou.
Mulheres
O estudo feito pelo Instituto Sangari também revela que o Distrito Federal está malposicionado quando o assunto é a violência contra a mulher. A capital da República é a sétima no ranking nacional em número de mulheres executadas. Para cada 100 mil habitantes, 5,8 pessoas do sexo feminino são mortas. O primeiro lugar é ocupado pelo Espírito Santo, que concentra uma média de 9,4 assassinatos.
Na avaliação nacional, o estudo indica que a proporção de homens assassinados é bem maior. Os dados de 2010 apontam que, dos 49.932 homicídios registrados em todo o país, 45.617 tiveram como vítimas pessoas do sexo masculino. Ou seja, 91,4% do total, contra 8,6%.
"A verdade é que, no Brasil e especialmente no DF, a violência tem endereço, sexo e cor. O primeiro suspeito num grupo é sempre o rapaz negro, pobre e que mora na periferia. Isso agride a dignidade da pessoa e faz com que muitos cresçam revoltados"

Jacira da Silva,coordenadora do Movimento Unificado do DF

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