Debater a chamada Lei da Palmada, a esta altura, é tarefa quase inócua. Tendo sido aprovada pela Câmara e pelo Senado, seguirá para sanção da presidente Dilma Rousseff (PT) nos próximos dias. Por ser um projeto de iniciativa do Executivo, seus dispositivos devem ser ratificados sem mudanças.
Mais que o debate, é a própria legislação que se revela inócua; mas este fato, que advogados ouvidos por esta Folha apontaram com precisão, não impediu o Congresso de sacramentar a nova norma.
Entende-se a motivação parlamentar. Embora alguns setores defendam o recurso ao castigo físico como (suposta) forma de educar os filhos, visões mais modernas e pedagogicamente embasadas rechaçam a brutalidade e mesmo a intimidação no ambiente doméstico.
Na sociedade em geral, e na vida familiar em especial, a violência se mostra não só desnecessária e inútil do ponto de vista da educação mas também contraproducente: o ressentimento e o trauma são dois de seus subprodutos tão indesejáveis quanto frequentes.
A esses aspectos, que já seriam o bastante, acrescenta-se o óbvio imperativo de proteger as crianças contra tratamentos desumanos ou degradantes. Mas tal noção não se restringe ao plano educacional; todos os cidadãos, e não apenas os infantes, têm o direito de se verem a salvo de práticas cruéis.
Não por acaso esse mandamento consta da própria Constituição; lesões corporais e maus-tratos, por sua vez, são condutas tipificadas no Código Penal. Aquilo que se pretende impedir com a Lei da Palmada --sofrimento físico, ferimento, humilhação--, portanto, já é coibido pelo ordenamento brasileiro.
Supérflua quanto aos resultados pretendidos, a nova norma poderá ter consequências inconvenientes. Como não proíbe a palmada em si, restará ao Judiciário definir se um tapinha enquadra-se nos critérios da lei. Surge, assim, a hipótese de a Justiça terminar abarrotada por uma onda de denuncismo.
No cenário mais provável, contudo, o diploma não terá efeito prático nenhum. Ampliará, assim, a lista de "leis que não pegam" --um rol que, por ironia, estimula a desobediência de certos limites.
Em vez de reforçar esse costume que deseduca a população, melhor seria investir em campanhas de esclarecimento, com base no mesmo princípio que subjaz à Lei da Palmada: antes dialogar do que punir.
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